terça-feira, junho 6, 2023
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O que deve ser feito por pais, governos e imprensa para conter onda de violência nas escolas

Pais de alunos em pânico com ameaças de atentados nas escolas de seus filhos. População apavorada com os atentados violentos e cruéis registrados nas últimas semanas. Multiplicam-se as ocorrências, as ameaças e até falsas ameaças.

Escolas de Belém, Ananindeua, Anapu, Santarém, Tailândia, Novo Progresso, Vigia tiveram registros de ameaças nos últimos dias.

Em Marabá ataque ia acontecer e a polícia interveio e salvou a escola.

Em Belém um estudante foi esfaqueado dia 30/3 na escola Palmira Gabriel no Tenoné. Há registros de novas ameaças na escola.

Em busca de respostas para o pânico que a população brasileira e especificamente, os paraenses estão vivendo, diogenesbrandao.com buscou um dos principais pesquisadores sobre o tema.

Coordenador de estudo sobre violência na região Norte, o professor e pesquisador da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Aiala Colares*, coordenou uma pesquisa sobre o tema, desenvolvida em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O especialista em Segurança Pública, Aiala Colares defende que haja ações distintas e integradas para prevenir violência nas escolas e alerta: “banalização da violência e apologia ao ódio faz parte do cotidiano de muitos adolescentes e jovens no ambiente de jogos on-line e redes sociais”.

Leia a entrevista exclusiva:

diogenesbrandao.com: Professor, este é um cenário exagerado ou é exatamente assim que estamos vivendo esses dias de terror? Ou seja, primeiramente, qual é sua visão sobre o quadro de terror instalado?

Primeiramente, é importante destacarmos que muitas escolas públicas pelo Brasil afora passam por situações de violência, basta conversar com professores e técnicos que os relatos aparecem de forma natural. De qualquer forma, o contexto social do aluno e o contexto familiar são reproduzidos no ambiente escolar e quando a escola não sabe lidar com este contexto, torna-se refém e vitima da violência. A naturalização da violência hoje aparece em jogos eletrônicos, redes sociais e até mesmo em discursos políticos, assim, todo cuidado é pouco em relação a evitar banalizar atos violentos, sejam eles físicos, sejam eles psicológicos.

A nova unidade do colégio Sophos no bairro do Marambaia, amanheceu com uma viatura da PM na entrada do portão, após pais terem conhecimento da ameaça que passou a circular nas redes sociais.

diogenesbrandao.com: O senhor já consegue identificar a origem sociológica ou psicossocial dessa onda de violência aterrorizante? Complementando, qual é o perfil psicopatológico dos adolescentes, jovens e adultos que cometem esses atos de terror?

Acontece que os jovens têm sua rede social, ou seja, sua rede de relações sociais cotidianas, seja na rua ou no bairro em que residem, seja no ambiente familiar que pode ser desestruturado ou então deve faltar diálogo entre pais e filhos. Nesse sentido, os jovens tornam-se vulneráveis para a dinâmica do crime e da violência. Falo isso em relação às escola públicas, onde mais ocorrências de casos de violência são registradas. Mas, isso não significa dizer que as escolas particulares estão livres, pois nesse caso temos situações em que as famílias mesmo estruturadas não dão atenção suficiente para os filhos que passam grande parte do tempo em frente aos computadores e em jogos eletrônicos e aí temos um grande problema, principalmente quando os jogos são de incitação ao ódio. Nesse sentido, em casos de esquizofrenia ou de surtos psicóticos, lembranças ruins podem vir como as relacionadas ao bullying. Diante disto, essas pessoas tornam-se ameaças à escola seja qual for, as escolas tornam-se alvo pelo simples fato de serem o lugar de lembranças negativas dos agressores.

Famoso por ser uma das principais vias de compartilhamento de Fake News, o Whatsapp está repleto de mensagens alarmistas, que acabam por amedontrar a população, criando uma sensação de insegurança que apavora e toma proporções inimagináveis.

diogenesbrandao.com: Como estudioso do tema, que outras ondas de violência dessa natureza já foram registradas no mundo, que o senhor destacaria como análogos ao que vem acontecendo no Pará e no Brasil? Pode haver similaridade na origem dessas ocorrências?

Em todos os lugares os ataques estão relacionados ao bullying, esquizofrenia, surtos psicóticos, ou seja, nunca foi tão importante a presença de um psicólogo nas escolas. Porém, em alguns casos os contextos sociais de violência têm uma grande influência no comportamento dos jovens dentro do ambiente escolar e isso deve ser um elemento a se considerar. Logo, minha conclusão é de que é preciso analisar os fatos e os contextos sociais nos quais os agressores estão inseridos para se pensar medidas estratégicas.

diogenesbrandao.com: Como foi que atuaram as sociedades que conseguiram zerar ou reduzir drasticamente essas ondas?

O enfrentamento à violência está relacionado a um conjunto de medidas estratégicas que buscam integrar as escolas à sociedade de forma a transformar o ambiente escolar em um ambiente acolhedor, ou seja, é preciso dialogar com as famílias e com a realidade do entorno da escola para se pensar o modelo ideal. A escola é uma grande ferramenta de enfrentamento à violência, assim sendo, acompanhamentos psicopedagógicos são importantes para esse processo. Logo, os países que conseguiram esse tipo de organização avançaram muito, mas é preciso destacar que quando falamos de ataques realizados por pessoas com problemas psicológicos, os ataques serão sempre uma surpresa e nenhuma escola está livre de uma ação.

A prefeitura Municipal de Porto de Moz suspendeu as aulas no dia de hoje, em razão de possíveis episódios de violência.

diogenesbrandao.com: O que deve ser feito pelos governos e comunidade escolar para identificar ameaças reais e suspeitas, para prevenir e evitar esse tipo de violência?

Acredito que é preciso observar os comportamentos dos alunos em sala de aula e na escola, esse é um passo importante para poder prevenir essas ações. Em segundo lugar, devem ser criados canais de denúncias e de investigações. Por fim, acredito nesse momento voltarmos a pensar em segurança escolar com a presença de uma guarda especializada, que inclusive, ministre palestras e participe das atividades na escola.

diogenesbrandao.com: O que deve ser feito pelos pais e responsáveis, na relação com seus filhos, dentro de casa?

Essa é uma pergunta importante, mas deve ser respondida para públicos diferentes, pois se estivermos falando de uma classe média e uma família estruturada eu respondo: devem observar mais as atividades dos filhos na escola, em casa e na sociedade. A partir daí, quando verificarem comportamentos estranhos procurar imediatamente ajuda. Agora, quando falamos de jovens e adolescentes de escolas públicas, muitas vezes são filhos de mães solteiras ou são criados pelos avós, vivem em um ambiente conturbado e tudo isso a escola tem que observar, todavia, sabemos o quanto que isso sobrecarrega a escola em termos de responsabilidade, lhes faltando pernas para lidar com estas situações.

diogenesbrandao.com: Qual é o papel da imprensa neste momento? Como os profissionais e veículos de comunicação devem tratar esses temas?

A imprensa deve ter cuidado para não transformar a matéria ou cobertura do ocorrido em algo que desperte motivação para mais ataques. Ou seja, sempre tendo cuidado em não fazer com que o autor dos atos seja uma referência para outras pessoas que estão apenas aguardando uma motivação.

diogenesbrandao.com: Qual é o papel das redes sociais neste processo? Em que ponto elas são canais de disseminação do ódio e o que o cidadão comum pode fazer para combatê-los e denunciá-los?

O maior desafio são as redes sociais, elas são dinâmicas e muitas vezes responsáveis por disseminar uma cultura de violência. Não sei até que ponto podemos regular estes fluxos de informações. Vejo que temos que estar vigilantes quanto a isso e até mesmo buscar formas de identificar atitudes suspeitas e comportamentos anormais para podermos nos antecipar uma ação evitando uma catástrofe.

*Aiala Colares é Geógrafo formado pela UFPA. Doutor em Ciências do desenvolvimento socioambiental pelo NAEA-UFPA. Pós Doutor em Geografia Humana pela UFPE. Especialista em Segurança Pública. Professor e Pesquisador da UEPA.

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